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Eliane Brum lança em Paris tradução francesa de ensaio sobre luta contra desmatamento na Amazônia

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A jornalista, escritora e ativista ambiental Eliane Brum acaba de lançar em Paris a tradução em francês de seu livro “BANZEIRO ÒKÒTÓ - Uma viagem à Amazônia Centro do Mundo”, que documenta a luta contra a destruição ambiental na região, livro publicado originalmente no Brasil em 2021. Ela conversou com a RFI sobre temas como a responsabilidade da Europa no contexto do desmatamento, a inversão do olhar entre colonizados e colonizadores e a preservação da maior floresta tropical do mundo.

(Para ver a entrevista na íntegra, clique na imagem principal da matéria)

“Para mim, é muito importante dizer claramente que a ferida que se abriu na Amazônia, ou que a Amazônia se tornou uma terra ferida, com povos feridos, por conta justamente de países como a França”, dispara a jornalista e ensaísta Eliane Brum, que se mudou para a cidade de Altamira, no coração do Xingu, em 2017, e que desde então vem documentando a luta contra a destruição da floresta e dos povos originários, entre indígenas, ribeirinhos e quilombolas.

"Isso por conta de uma ocupação colonial, de uma invasão colonial que, há mais de 500 anos, converteu territórios e natureza em mercadoria, né? [uma invasão que] Violou os corpos, invadiu os corpos, esvaziou os corpos, converteu os corpos em mercadoria. A gente só consegue entender a ferida amazônica, não só pela destruição dos corpos dos povos humanos que ocupavam e ainda resistem na Amazônia, como os povos indígenas, mas também através do prisma da escravidão africana", argumenta.

“Hoje, entre os povos da Amazônia que resistem, nós temos os povos originários, os indígenas, e os povos quilombolas, que são descendentes de escravos que se rebelaram. E temos os povos ribeirinhos que também já vêm de uma pós-colonização, uma resistência a partir de uma violência colonizadora. E essa colonização continua, né? Por exemplo, com o adiamento [do Conselho Europeu] da lei antidesmatamento”, contextualiza a escritora.

Paris, "periferia" do planeta

“Eu considero que se estou em Paris, estou na periferia do mundo, porque eu e várias outras pessoas, nós defendemos que o centro, os centros do mundo, num planeta em colapso climático e nascesse a extinção em massa de espécies, é onde estão os enclaves de natureza”, afirma. “São lugares que resistem como a Amazônia, como os oceanos, como as outras florestas tropicais, como os outros biomas, e não onde estão os chamados centros financeiros e políticos, onde estão sendo tomadas as decisões que destroem a Amazônia e os outros biomas”, defende a jornalista.

“Isso não é retórica, é um deslocamento de centralidades que nos parece fundamental, crucial para que a gente tenha alguma chance diante de um planeta que já está há vários meses com um aquecimento, um aumento de temperatura de 1,5 °C, com um número cada vez maior de eventos [climáticos] extremos, que também são cada vez mais graves. Então a gente defende esse deslocamento, que significa colocar no centro outros valores, os valores dos povos que não se separaram da natureza. Então, lançar o livro em Paris é lançar meu livro na periferia do mundo, para provocar uma discussão que tem que partir do colonialismo, que ainda é continua em vigor”, afirma Brum.

Mediação entre mundos

Questionada sobre a possibilidade de realizar uma mediação entre as visões de mundo dos povos originários e das grandes potências em 2024, Brum se mostra cética. “Eu não sei se é possível conciliar o inconciliável. Pensando que nós somos linguagem, como tudo aquilo que nos constitui, a que teve e que vem destruindo a natureza e nos levando ao abismo climático é uma linguagem patriarcal, branca, masculina, binária, colonialista”, analisa. “A gente precisa se tornar outra linguagem. Estou falando de nós, não indígenas, né? Nós que não somos povos tradicionais, precisamos nos tornar outra linguagem, se a gente quiser ter uma chance [de sobreviver]”, diz a escritora.

“Como fazer uma mediação, quando o Congresso aprova uma lei que diz que os povos originários só têm direito a suas terras se eles estavam em suas terras em outubro de 1988, quando foi promulgada a atual Constituição, quando se sabe perfeitamente que a grande parte dos povos não estavam, ou porque tinham sido expulsos ou porque precisaram fugir para não serem exterminados”, questiona Eliane Brum.

Lula: avanços em meio a discurso ambíguo

Sobre os dados oficiais que mostram que o desmatamento caiu 22% no ano passado e que as operações em campo, as multas e o combate ao crime aumentaram, assim como o orçamento dedicado ao meio ambiente no Brasil, Eliane Brum considera que avanços importantes foram feitos no governo Lula, mas que o discurso do presidente é "ambíguo" em muitas questões relevantes para o tema.

“Lula foi eleito por uma frente ampla para poder derrotar Bolsonaro, e conseguiu. Conseguimos derrotar Bolsonaro por muito pouco, foi um movimento do Brasil. E essa frente ampla tem desde pessoas absolutamente respeitáveis e com uma coerência extrema com uma ministra do Meio Ambiente e das mudanças climáticas, Marina Silva, e com destruidores da Amazônia, então há muitas disputas internas dentro do governo”, contextualiza Brum.

“Essa redução do desmatamento é admirável diante das barreiras que a Marina e o Ibama enfrentam, também dentro do governo e num Congresso que é o pior da história do Brasil, dominado pelo agronegócio predatório, pelo lobby das grandes corporações transacionais de soja, de carne, de ultra processados, de agrotóxicos”, continua.

“Lula tem um discurso muito ambíguo”, considera. “De um lado ele fala da crise climática, do combate ao fogo, ao desmatamento, mas, da mesma maneira, efetivamente o planejamento da Petrobras é aumentar a produção de petróleo. O Lula defende isso, defende uma abertura de uma nova frente de exploração de petróleo na Amazônia que é absolutamente absurdo”, aponta a jornalista.

“Nesse momento de queima da floresta, de biomas como o Pantanal e o cerrado, ele defende a pavimentação da BR que liga Porto Velho a Manaus, e que comprovadamente vai multiplicar o desmatamento e as destruições em cadeia na Amazônia e a Ferrogrão, que é uma ferrovia que vai cortar a floresta para transportar commodities, como a soja que devasta a Amazônia para alimentar porcos na China e em outros lugares também aqui na Europa. Então é um discurso muito ambíguo, que vem de uma esquerda que ainda está presa ao século 20”, considera.

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A jornalista, escritora e ativista ambiental Eliane Brum acaba de lançar em Paris a tradução em francês de seu livro “BANZEIRO ÒKÒTÓ - Uma viagem à Amazônia Centro do Mundo”, que documenta a luta contra a destruição ambiental na região, livro publicado originalmente no Brasil em 2021. Ela conversou com a RFI sobre temas como a responsabilidade da Europa no contexto do desmatamento, a inversão do olhar entre colonizados e colonizadores e a preservação da maior floresta tropical do mundo.

(Para ver a entrevista na íntegra, clique na imagem principal da matéria)

“Para mim, é muito importante dizer claramente que a ferida que se abriu na Amazônia, ou que a Amazônia se tornou uma terra ferida, com povos feridos, por conta justamente de países como a França”, dispara a jornalista e ensaísta Eliane Brum, que se mudou para a cidade de Altamira, no coração do Xingu, em 2017, e que desde então vem documentando a luta contra a destruição da floresta e dos povos originários, entre indígenas, ribeirinhos e quilombolas.

"Isso por conta de uma ocupação colonial, de uma invasão colonial que, há mais de 500 anos, converteu territórios e natureza em mercadoria, né? [uma invasão que] Violou os corpos, invadiu os corpos, esvaziou os corpos, converteu os corpos em mercadoria. A gente só consegue entender a ferida amazônica, não só pela destruição dos corpos dos povos humanos que ocupavam e ainda resistem na Amazônia, como os povos indígenas, mas também através do prisma da escravidão africana", argumenta.

“Hoje, entre os povos da Amazônia que resistem, nós temos os povos originários, os indígenas, e os povos quilombolas, que são descendentes de escravos que se rebelaram. E temos os povos ribeirinhos que também já vêm de uma pós-colonização, uma resistência a partir de uma violência colonizadora. E essa colonização continua, né? Por exemplo, com o adiamento [do Conselho Europeu] da lei antidesmatamento”, contextualiza a escritora.

Paris, "periferia" do planeta

“Eu considero que se estou em Paris, estou na periferia do mundo, porque eu e várias outras pessoas, nós defendemos que o centro, os centros do mundo, num planeta em colapso climático e nascesse a extinção em massa de espécies, é onde estão os enclaves de natureza”, afirma. “São lugares que resistem como a Amazônia, como os oceanos, como as outras florestas tropicais, como os outros biomas, e não onde estão os chamados centros financeiros e políticos, onde estão sendo tomadas as decisões que destroem a Amazônia e os outros biomas”, defende a jornalista.

“Isso não é retórica, é um deslocamento de centralidades que nos parece fundamental, crucial para que a gente tenha alguma chance diante de um planeta que já está há vários meses com um aquecimento, um aumento de temperatura de 1,5 °C, com um número cada vez maior de eventos [climáticos] extremos, que também são cada vez mais graves. Então a gente defende esse deslocamento, que significa colocar no centro outros valores, os valores dos povos que não se separaram da natureza. Então, lançar o livro em Paris é lançar meu livro na periferia do mundo, para provocar uma discussão que tem que partir do colonialismo, que ainda é continua em vigor”, afirma Brum.

Mediação entre mundos

Questionada sobre a possibilidade de realizar uma mediação entre as visões de mundo dos povos originários e das grandes potências em 2024, Brum se mostra cética. “Eu não sei se é possível conciliar o inconciliável. Pensando que nós somos linguagem, como tudo aquilo que nos constitui, a que teve e que vem destruindo a natureza e nos levando ao abismo climático é uma linguagem patriarcal, branca, masculina, binária, colonialista”, analisa. “A gente precisa se tornar outra linguagem. Estou falando de nós, não indígenas, né? Nós que não somos povos tradicionais, precisamos nos tornar outra linguagem, se a gente quiser ter uma chance [de sobreviver]”, diz a escritora.

“Como fazer uma mediação, quando o Congresso aprova uma lei que diz que os povos originários só têm direito a suas terras se eles estavam em suas terras em outubro de 1988, quando foi promulgada a atual Constituição, quando se sabe perfeitamente que a grande parte dos povos não estavam, ou porque tinham sido expulsos ou porque precisaram fugir para não serem exterminados”, questiona Eliane Brum.

Lula: avanços em meio a discurso ambíguo

Sobre os dados oficiais que mostram que o desmatamento caiu 22% no ano passado e que as operações em campo, as multas e o combate ao crime aumentaram, assim como o orçamento dedicado ao meio ambiente no Brasil, Eliane Brum considera que avanços importantes foram feitos no governo Lula, mas que o discurso do presidente é "ambíguo" em muitas questões relevantes para o tema.

“Lula foi eleito por uma frente ampla para poder derrotar Bolsonaro, e conseguiu. Conseguimos derrotar Bolsonaro por muito pouco, foi um movimento do Brasil. E essa frente ampla tem desde pessoas absolutamente respeitáveis e com uma coerência extrema com uma ministra do Meio Ambiente e das mudanças climáticas, Marina Silva, e com destruidores da Amazônia, então há muitas disputas internas dentro do governo”, contextualiza Brum.

“Essa redução do desmatamento é admirável diante das barreiras que a Marina e o Ibama enfrentam, também dentro do governo e num Congresso que é o pior da história do Brasil, dominado pelo agronegócio predatório, pelo lobby das grandes corporações transacionais de soja, de carne, de ultra processados, de agrotóxicos”, continua.

“Lula tem um discurso muito ambíguo”, considera. “De um lado ele fala da crise climática, do combate ao fogo, ao desmatamento, mas, da mesma maneira, efetivamente o planejamento da Petrobras é aumentar a produção de petróleo. O Lula defende isso, defende uma abertura de uma nova frente de exploração de petróleo na Amazônia que é absolutamente absurdo”, aponta a jornalista.

“Nesse momento de queima da floresta, de biomas como o Pantanal e o cerrado, ele defende a pavimentação da BR que liga Porto Velho a Manaus, e que comprovadamente vai multiplicar o desmatamento e as destruições em cadeia na Amazônia e a Ferrogrão, que é uma ferrovia que vai cortar a floresta para transportar commodities, como a soja que devasta a Amazônia para alimentar porcos na China e em outros lugares também aqui na Europa. Então é um discurso muito ambíguo, que vem de uma esquerda que ainda está presa ao século 20”, considera.

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